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Criança vegetariana: pode isso?

Segundo entidades médicas, sim! Só é preciso cautela para contornar possíveis deficiências nutricionais. Veja como construir esse menu direito

Por Giovana Feix
Atualizado em 14 jun 2019, 10h36 - Publicado em 18 Maio 2018, 10h02
crianças vegetarianas dieta
Número de crianças vegetarianas tende a crescer no Brasil. (Foto: Povareshka/iStock)
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A nutricionista clínica Ana Ceregatti, especializada em vegetarianismo, nunca vai se esquecer de Júlia, pequena paciente que recebeu em seu consultório em Campinas, no interior paulista. Com 5 anos de idade, a menina carregava uma boneca e uma mamadeira. Dentro da garrafa, havia um líquido de mentirinha – mas que, para a garota, possuía grande valor. “Trouxe leite de amêndoas para ela”, explicou.

Júlia decidiu desde muito cedo que não comeria “bichinhos” – nem alimentos derivados deles. Natural, então, excluir o leite de vaca da dieta de sua bonequinha. O mais surpreendente é que seus pais não tiveram nada a ver com a opção. Onívoros, eles consumiam fontes animais numa boa – daí porque marcaram a nutricionista para a menina.

Embora sua história seja peculiar, Júlia faz parte de uma fatia da população infantil que só tende a se multiplicar. Segundo pesquisa do Ibope, 15,2 milhões de brasileiros com mais de 18 anos se declaravam vegetarianos em 2012. É muito provável que os descendentes de toda essa gente sejam criados segundo os hábitos alimentares dos pais. Mas isso leva ao questionamento: será que essa é realmente uma dieta apropriada para quem está em plena fase de desenvolvimento?

O que as entidades médicas dizem sobre o assunto

Para a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), os pequenos podem, sim, ser vegetarianos. A entidade não está sozinha nessa posição. A Associação Dietética Americana, a Academia Americana de Pediatria e a Sociedade Canadense de Pediatria pensam da mesma maneira. Para auxiliar os profissionais a lidarem com esse público crescente, a SBP até lançou, no ano passado, um guia prático sobre vegetarianismo na infância e na adolescência.

Os autores do documento ponderam que existe o risco de os pequenos desenvolverem deficiências nutricionais, já que acabam consumindo menos grupos alimentares. De acordo com o guia, esses cardápios deixam a desejar, em geral, em energia, gorduras, ferro, vitamina B12, cálcio e zinco. Mas, com o devido acompanhamento de um profissional especializado (e com a suplementação de nutrientes, se necessário), não haveria perigo em crescer longe de produtos de origem animal.

Só que ensinar a driblar as limitações não é sinônimo de aprovação da dieta. Veja: apesar de ter feito parte do time que escreveu o guia, a pediatra Virgínia Weffort, presidente do Departamento Científico de Nutrologia da SBP, não gosta da ideia de uma criança ser vegetariana. “O mais saudável é obter os nutrientes a partir da comida”, diz, fazendo referência aos suplementos. “A absorção de um medicamento pode ser prejudicada por vários fatores”, justifica.

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A suplementação não é citada à toa. Segundo a SBP, ao focar somente na quantidade de nutrientes presente nos vegetais, pode parecer que está tudo ótimo. Porém, o que conta é a biodisponibilidade das substâncias – em resumo, o teor de vitaminas e minerais que nosso corpo consegue, de fato, assimilar.

Nesse ponto, produtos de origem vegetal podem sair perdendo. Por exemplo: embora o tofu concentre cálcio, o aproveitamento do mineral seria melhor a partir do consumo de leite de vaca. Diferenças assim elevariam o risco de déficit nutricional.

Contudo, nutricionistas que atuam com alimentação vegetariana contestam esse tipo de informação. “Entre os profissionais que participaram da elaboração do documento, nenhum é especializado em vegetarianismo”, argumenta Ana. “Além disso, há dados que não se confirmam na prática”, critica.

Ela menciona o alerta que a SBP faz sobre o excesso de fibras. De acordo com a entidade, a situação seria comum entre crianças vegetarianas – e isso prejudicaria a absorção de nutrientes. “Meu público é basicamente vegetariano e poucas vezes tive que reduzir a ingestão de fibras”, diz Ana.

Aline Camargo, nutricionista clínica especializada em nutrição infantil e associada à Sociedade Vegetariana Brasileira, ressalta que os pequenos onívoros também estão sujeitos à falta de nutrientes. “Tanto que a suplementação de ferro é indicada para qualquer criança a partir dos 6 meses de idade”, cita.

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Não para por aí. Ela observa que a falta de vitamina B12 no organismo, dificuldade frequentemente enfrentada por vegetarianos, é bastante comum entre os que comem de tudo. “Grande parte dos compostos vitamínicos para crianças inclui a B12, porque, atualmente, há uma carência grande dessa vitamina em toda a população”, comenta.

De qualquer forma, nem sempre a criança vai precisar de suplemento. “Isso só se faz necessário quando o aporte de nutrientes não é suficiente”, alega Ana Beatriz Barrella, nutricionista da RG Nutri, em São Paulo. No mais, Ana Ceregatti faz questão de reforçar que não é só o prato dos vegetarianos que merece atenção. “A dieta do brasileiro em geral é desequilibrada”, afirma. “Se só arroz, feijão e carne formam o hábito alimentar do indivíduo, isso já é preocupante”, avalia.

Respeito à mesa

Quem cria o filho como vegetariano devido às próprias convicções pode passar por um momento delicado, em que a criança se mostra curiosa para provar um pedaço de bife. “O pai não deve se impor”, orienta Talitta Maciel, nutricionista clínica de Barueri (SP). “Se o pequeno quiser experimentar, é importante dar autorização”, diz.

No caso de Júlia, a garotinha que oferece extrato de amêndoas para a boneca, o caminho foi o oposto – a pequena influenciou a mãe, que acabou virando vegetariana. Independentemente da situação, é essencial que a primeira meta dos pais seja garantir aos filhos uma alimentação nutritiva e equilibrada.

Recorrer à internet para montar o cardápio infantil está longe de ser a melhor pedida. O menu deveria sair é do consultório de um profissional especializado. Afinal, não dá para bobear nessa fase. A saúde no futuro depende das primeiras garfadas.

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Como o vegetarianismo é dividido

Ovolacto-vegetariano: é aquele que, apesar de não ingerir carne alguma, ainda come ovos e laticínios.

Lacto-vegetariano: opta por deixar os ovos de fora da alimentação. Leite e derivados podem fazer parte da rotina.

Ovo-vegetariano: ao contrário do lactovegetariano, come ovos. Mas corta o leite e todos os seus derivados.

Vegetariano: a palavra designa quem não come nada de fonte animal. Na prática, porém, também denomina os ovolacto.

Vegano: recusa qualquer coisa que envolva sofrimento animal – comida, produtos à base de couro e até mesmo idas ao zoológico.

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Fique atento aos nutrientes

Os nutrientes abaixo nem sempre são ingeridos na medida por vegetarianos. Fique de olho!

Proteína: A carne é símbolo desse nutriente – que, diga-se, é de alta qualidade no bife. Entre as fontes vegetais, destacam-se as leguminosas, como o feijão. Misture-o ao arroz para obter uma proteína completa.

Zinco: Castanhas, grãos integrais, cereais e feijões são ricos no mineral. Ele é importante para o desenvolvimento da linguagem e da memória, além de contribuir para o crescimento físico.

Vitamina B12: Sua falta pode causar um tipo de anemia, ameaçadora para o cérebro e o coração. A vitamina está em alimentos de origem animal. Logo, é preciso avaliar necessidade de suplementação.

Cálcio: Deficiências de cálcio na infância podem levar a osteoporose e fraturas no futuro. Os laticínios esbanjam o mineral. Se tirá-los da dieta, aposte pesado em folhas verde-escuras e também no gergelim.

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Ferro: Essencial para o cérebro, ele está em leguminosas, folhas verde-escuras e outros vegetais, como a beterraba. Para aproveitá-lo melhor, combine com fontes de vitamina C, a exemplo da laranja.

Ômega-3: Tem funções anti-inflamatórias e compõe o sistema nervoso. Não é tão abundante na dieta onívora, pois se come pouco peixe. No reino vegetal, é encontrado nas sementes de chia e linhaça.

Sintomas de deficiência nutricional

A falta de nutrientes na criança pode causar…

  • Dificuldade para começar a falar
  • Mau desempenho na escola
  • Problemas de memória
  • Infecções de repetição
  • Falta de apetite
  • Cansaço excessivo
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