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Virosfera

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O mundo também é dos vírus. E o virologista e especialista em coronavírus Paulo Eduardo Brandão, professor da Universidade de São Paulo (USP), guia nosso olhar sobre esses e outros micróbios que circulam por aí.

Como vírus e bactérias inspiraram a criação da edição genética humana

Da defesa de um contra o outro nasceu o sistema CRISPR, uma das maiores revoluções da biotecnologia moderna e da medicina

Por Paulo Eduardo Brandão
6 nov 2025, 14h29 •
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Terapias gênicas fazem parte de um mercado amplo e em expansão (Foto: Freepik/Divulgação)
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  • Há dois lados essenciais que devem ser considerados quando pensamos em imunidade: distinguir o que é amigo do que é inimigo.

    Isso porque a ideia da imunidade é atacar e destruir o que é estranho e não tocar naquilo que é próprio do organismo porque, claro, seria muito mal ter nosso sistema imune atacando a nós mesmos. Isso às vezes acontece e dá no que se conhece como doenças autoimunes.

    Aprendemos o que é próprio de nosso organismo quando ainda somos embriões. Daí, o que não tiver o carimbo de “próprio” vai ser apresentado ao sistema imune e ele daí vai “taxar” o invasor com uma série de células, anticorpos e substâncias químicas para eliminá-lo, diminuir sua quantidade ou suas consequências.

    E não é interessante saber que “imune” vem do latim immunis, que quer dizer “livre de taxas”? Se sou imune a um vírus, quer dizer que eu não pago taxas a ele.

    O papel dos vírus e bactérias na evolução da imunidade

    Na Virosfera, vírus estão em todos os lugares e infectam todos os tipos de seres vivos, até mesmo outros vírus. Bactérias, por exemplo, são infectadas por vírus chamados de bacteriófagos, dos quais já falamos antes. E é justamente do sistema de defesa das bactérias contra estes vírus que nasceu uma revolução que se espalha da Biologia pela Filosofia e pela Ética.

    Bactérias não têm anticorpos e não podem contar com células especializadas em eliminar patógenos como nós. Mas elas têm algo muito, muito interessante: um sistema imune que usa pedaços de genomas virais.

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    O nascimento do sistema CRISPR

    Em 1987, alguns bacteriologistas começaram a notar que o DNA de bactérias continha umas sequências de letras repetitivas curtas e agrupadas. Estas sequências de letras eram iguais quando lidas da esquerda para a direita ou da direita para a esquerda, o que é chamado de palíndromo, tipo a frase “socorram-me subi no ônibus em Marrocos”. Mas ninguém sabia para que isso servia ou de onde vinha.

    E eis que pesquisadores que trabalhavam com fabricação de iogurte em uma empresa dinamarquesa notaram que estas sequências presentes na bactéria Streptococcus thermophilus, da qual a fabricação de iogurte depende, eram idênticas a partes do DNA de alguns bacteriófagos que a infectam.

    E não era só isso: as bactérias que tinham estas sequências virais coladas no seu genoma eram resistentes aos bacteriófagos — o que é muito bom para a indústria!

    Mas como isso acontece? É aí que entraram as pesquisadoras norte-americana Jennifer Doudna e francesa Emmanuelle Charpentier. Estudando as tais sequências, formalmente chamadas de Clustered Regularly Interspaced Short Palindromic Repeats (CRISPR) — ou Repetições Palindrômicas Curtas Agrupadas e Regularmente Interespaçadas — elas descobriram que, quando um bacteriófago invade uma bactéria, se ela tiver colado no seu genoma um pedaço do DNA dele que capturou em uma infecção prévia, isso faz com que a bactéria produza uma sequência de RNA que sabe se ligar à sequência correspondente no genoma deste fago.

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    Esse RNA conduz um conjunto de enzimas que vão lá e destroem o DNA do fago — e sua vida segue normalmente. Mas, se a bactéria não tiver capturado estas sequências virais, ela não é imune ao bacteriófago — e é o fim para ela.

    Da fábrica de iogurte ao Prêmio Nobel

    Por terem desvendado como o sistema CRISPR funciona, elas ganharam o Prêmio Nobel de Química em 2020. OK, legal, descobrimos como fazer melhor o nosso iogurte — e para por aí? Não mesmo!

    Acontece que se tornou possível usar o sistema CRISPR para cortar genes não dos bacteriófagos, mas das próprias bactérias, de um modo “teleguiado”. E não só cortar: o sistema CRISPR tornou mais fácil editar genomas — não só deletando genes, mas modificando ou mesmo inserindo novos genes — revolucionando a biotecnologia e a engenharia genética.

    +Leia também: Os genes ao nosso alcance

    Os dilemas éticos da edição genética

    E aí veio a bomba: em 2018, o pesquisador chinês He Jiankui, sem aprovação das autoridades chinesas, pegou embriões humanos e, usando CRISPR, deletou de seus genomas o gene que codifica os receptores que deixam o vírus HIV entrar, tornando-os imunes ao HIV!

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    E mais: como ele fez isso em células embrionárias, as duas meninas que nasceram deste experimento podem passar seu genoma editado para seus descendentes.

    De um modo mais ético, a tecnologia CRISPR foi usada para tratar um tipo de anemia chamada anemia falciforme em pessoas. Funcionou muito bem e, ao contrário do experimento chinês, não houve interferência nas células germinativas, precursoras de óvulos e espermatozoides, que poderiam passar a mutação para filhos e filhas.

    O futuro da edição genética

    Temos agora, graças aos vírus e bactérias, a possibilidade que nenhuma espécie na Terra jamais teve: a de não depender do acaso para termos mutações em nosso genoma.

    Podemos eliminar doenças genéticas, podemos acabar com infecções virais usando a versão hereditária do CRISPR. Mas devemos produzir crianças sob medida? Tipo: “quero olhos azuis, cabelos pretos, 1,90m de altura” e por aí vai. Isso não vai aumentar as diferenças sociais, já que poucos poderiam pagar por isso? Isso não é uma forma de eugenia, parte do fascismo do passado e do presente?

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    Agora é o momento de discutirmos isso, pois, como disse o general Maximus Decimus Meridius, “o que fazemos em vida ecoa na eternidade”.

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