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Treinamento para os pés reduz o risco de lesão na corrida

Exercitar a musculatura dos pés é ainda mais benéfico para pessoas sedentárias. Entre idosos, hábito diminui a probabilidade de quedas

Por José Tadeu Arantes, da Agência Fapesp*
Atualizado em 10 ago 2021, 10h59 - Publicado em 9 ago 2021, 13h07
dor na sola dos pés
Essa inflamação atinge a fáscia plantar, tecido fibroso que absorve o impacto dos movimentos dos pés (Foto: Gustavo Arrais/SAÚDE é Vital)
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Dos vários sistemas naturais de amortecimento do organismo humano, os pés talvez sejam os mais importantes. São eles que recebem toda a carga do corpo quando parado ou em movimento. Para isso, cada pé possui uma estrutura extremamente rica e complexa, composta por 25 músculos intrínsecos (presentes apenas no pé), dez músculos extrínsecos (que conectam o pé à perna), 33 articulações e 108 ligamentos.

O problema é que, em um contexto urbano e cada vez mais artificial, muitas pessoas deixaram de andar descalças. E, incentivadas pela propaganda, passaram a usar calçados e tênis reforçados por uma parafernália de estruturas rígidas e amortecedores.

“As estruturas todas dos pés acabam se atrofiando com o uso reiterado desse tipo de calçado. É como se alguém passasse a utilizar diariamente um colar cervical para prevenir o pescoço de dores devido ao uso contínuo de telas. Em pouco tempo, a musculatura do pescoço perderia massa, força e funcionalidade”, diz Isabel Sacco, coordenadora do Laboratório de Biomecânica do Movimento e Postura Humana (Labimph) da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP).

Ela é coordenadora também do Projeto Temático “Biomecânica e aspectos funcionais do sistema musculoesquelético de corredores: efeito crônico de exercícios terapêuticos e do envelhecimento”, apoiado pela Fapesp. Dele participam pesquisadores da USP, da Universidade Federal do ABC (UFABC), da Universidade de Amsterdã (Universiteit van Amsterdam, UvA), nos Países Baixos, e do Instituto Ortopédico Rizzoli (Istituto Ortopedico Rizzoli, IOR), na Itália.

“Temos publicado os resultados de nossas pesquisas em periódicos internacionais especializados. Entre outros, destaco o artigo Foot Core Training to Prevent Running-Related Injuries: A Survival Analysis of a Single-Blind, Randomized Controlled Trial, publicado em The American Journal of Sports Medicine. Esse artigo foi produto de duas pesquisas de doutorado vinculadas ao nosso Projeto Temático. E, nele, mostramos que um treinamento simples para os pés reduziu em duas vezes e meia o risco de lesões em corredores recreacionais”, informa Sacco.

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Essa questão das lesões é crítica, porque afeta tanto esportistas quanto pessoas comuns. Como a corrida quase não exige qualquer tipo de equipamento, ela se tornou uma modalidade de exercício físico altamente disseminada e democrática. Tem gente de todo tipo correndo – o que é ótimo. O ruim é que a prevalência de lesão é altíssima: até 79% dos corredores podem sofrer alguma lesão em um ano.

+ Leia também: Caminhada é opção prática, barata e eficaz contra o sedentarismo

“A solução não é parar de correr. Mas adotar medidas preventivas que reduzam ou ao menos retardem o risco de lesão. Alongamento não funciona. É muito importante para a manutenção da saúde do sistema musculoesquelético, mas não para prevenir lesão. Orientação online e cartilhas para educar o corredor quanto a estratégias preventivas para a corrida, ou ainda condicionamento físico específico, também se mostraram ineficazes. Porque a lesão é multifatorial e não será um calçado ou um aquecimento especial que resolverá esse problema”, afirma Sacco.

Segundo a pesquisadora, o principal fator de risco para lesão é já ter sofrido alguma lesão anterior. Isso porque o corpo se vê obrigado a fazer uma série de compensações com o intuito de proteger a região lesionada e, assim, fica mais vulnerável a novas lesões.

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“O que descobrimos em nossa pesquisa foi que a melhor defesa do corredor contra lesão é melhorar a estrutura musculoesquelética dos pés para ganhar força e funcionalidade. Trabalhamos com um contingente de 120 corredores recreacionais. De forma aleatória, uma metade combinou a corrida com alongamentos, que foram adotados como placebo. E a outra metade combinou a corrida com treinamento para os pés. Depois de oito semanas, o ‘grupo treinamento’ teve uma redução de 2,42 vezes no número de lesões, comparativamente ao ‘grupo placebo’. Exames de ressonância magnética mostraram que, de fato, as pessoas que receberam treinamento tiveram um aumento de volume na musculatura dos pés”, relata Sacco.

Essa melhoria da saúde dos pés não contribuiu apenas para diminuir a incidência de lesão ou retardar sua eventual ocorrência. Modificou também a biomecânica da corrida, com um aumento da capacidade de impulsão vertical.

“A estratégia de treinamento que desenvolvemos, de baixo para cima [bottom-up], foi uma mudança de paradigma na área da reabilitação e prevenção em corrida, em que as várias escolas seguem tradicionalmente o caminho inverso [top-down], valorizando prioritariamente a musculatura do tronco e dos quadris, e negligenciando a importância da extremidade mais distal dos membros inferiores”, comenta Sacco.

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A pesquisadora acrescenta que o que é bom para as pessoas que se exercitam pode ser melhor ainda para as pessoas sedentárias. “Já se sabe que um treinamento para a musculatura dos pés, mais especificamente do hálux, o dedo maior pé, fez diminuir em sete vezes o risco de queda em idosos”, diz.

O treinamento para os pés é simples e pode ser feito em casa, com a ajuda de um software desenvolvido pelo próprio Labimph. Clique aqui para acessar.

Além dos exercícios específicos para os pés, a forma mais simples e natural de fortalecer os pés é andar sem calçados sempre que possível. Uma alternativa, para caminhar nas ruas ou mesmo dentro de casa nos dias frios, são os chamados calçados minimalistas. Muito mais baratos, esses sapatos ou tênis leves, denominados popularmente de “molecas”, deixam os pés menos imobilizados em seu interior. “Em outro estudo de nosso grupo, já mostramos que pessoas que sentiam dores nos joelhos por conta da osteoartrite apresentaram uma melhora de 62% depois que passaram a usar molecas”, afirma Sacco.

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*Esse texto foi publicado originalmente pela Agência Fapesp. 

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