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Cólera: os riscos e cuidados da doença que volta a crescer no mundo

No Brasil, a última epidemia pela bactéria Vibrio cholerae ocorreu na década de 1990. Mas a OMS alerta para aumento de surtos no mundo. Qual o risco aqui?

Por Lucas Rocha
17 jan 2024, 11h49
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A cólera é considerada um indicador de desigualdade e falta de desenvolvimento social (Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)
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A cólera é uma doença infecciosa intestinal aguda, causada por uma bactéria chamada Vibrio cholerae.

No Brasil, a última epidemia foi registrada na década de 1990. De acordo com o Ministério da Saúde, desde 2006, não foram detectados casos locais por aqui, apenas três importados. As infecções tiveram como origem Angola, em 2006, Republica Dominicana, em 2011, e Moçambique, em 2016.

Embora esteja aparentemente distante do nosso radar, a doença continua circulando pelo mundo, o que representa uma ameaça em potencial. Os indicadores mais recentes, por exemplo, apontam para um aumento no número de casos, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS).

Desde meados de 2021, o mundo enfrenta uma piora no cenário epidemiológico, caracterizada por múltiplos surtos em diversos países e pela disseminação até mesmo para áreas livres do agravo.

Naquele ano, os surtos de cólera chegaram a 23 países, com mais de 223 mil pacientes afetados. Já em 2022, 30 nações contabilizaram casos, com um total de mais de 472 mil infecções. No ano passado, mais um recorde. Foram detectados mais de 667 mil casos e 4 mil mortes no mundo.

Devido às diferentes estratégias de notificação de doenças utilizadas pelos sistemas de saúde dos países, esse número pode ser ainda maior. Estima-se que 1,3 a 4 milhões de pessoas em todo o mundo são infectadas a cada ano no mundo, sendo que de 21 a 143 mil morrem devido a complicações relacionadas.

Além disso, a doença afeta principalmente pessoas em situação de pobreza, que vivem em condições precárias de saneamento básico e acesso à água tratada.

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Mas, afinal, o que é a cólera e por que ela preocupa tanto?

+ Leia também: Radar da Saúde: Falta de saneamento básico faz brasileiros adoecerem

O que é a cólera?

A cólera é uma infecção associada a um quadro de diarreia aguda causada pela ingestão de alimentos ou água contaminados com a bactéria Vibrio cholerae.

Ao longo da história, foram vivenciadas sete pandemias da doença. A mais recente, e em curso, começou em 1961, partindo do Sul da Ásia, segundo a OMS.

O problema na verdade é provocado por uma toxina liberada pela bactéria. Uma vez presente no organismo, essa substância afeta diretamente as paredes do intestino, além  Além de alterar o fluxo de sódio e cloreto e fazer o corpo produzir grandes quantidades de líquido.

É justamente esse fator que está relacionado ao aspecto da diarreia aquosa, característica principal da infecção. Devido à perda de água, fluidos e sais minerais, o paciente tende a apresentar rapidamente uma desidratação que, se não tratada, pode levar à morte.

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Leia também: A criança e o direito ao saneamento básico

Como acontece a transmissão da cólera?

O contato humano com a bactéria causadora da doença acontece pela ingestão de água ou alimentos contaminados por resquícios de fezes contendo o micro-organismo.

É o que os médicos chamam tecnicamente de via “fecal-oral”. Exemplo: suponhamos que um indivíduo infectado tenha utilizado o banheiro, deixado de lavar as mãos adequadamente e, em seguida, fosse preparar uma refeição para a família.

Nesse momento, pode ocorrer a contaminação da comida, levando à transmissão do agente causador da doença. Em geral, uma pessoa segue eliminando a bactéria nas fezes até poucos dias após a cura.

Uma segunda forma de contágio é pela ingestão de mariscos, peixes e algas contaminados com a bactéria, quando consumidos crus ou mal cozidos.

A cólera é considerada um indicador de desigualdade e falta de desenvolvimento social, porque condições precárias de saneamento básico e de higiene pessoal e o consumo de água sem tratamento adequado e de alimentos sem higienização correta favorecem a disseminação do quadro.

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Higienização das mãos e dos alimentos ajuda a prevenir a cólera (Foto: gpointstudio/Freepik)

Quais são os sintomas da cólera?

Em parte dos casos, a cólera não apresenta sintomas – mas  as pessoas ainda assim podem contaminar alimentos.

Nos casos sintomáticos, a principal manifestação é uma diarreia muito intensa. Para ter ideia, a perda de líquidos pode chegar a 1 a 2 litros por hora, se o paciente apresentar diarreia e vômitos ao mesmo tempo.

“Podem aparecer outros sintomas que são típicos de infecções bacterianas, como febre, dor no corpo, vômito e mal estar extremo”, completa o infectologista Rodrigo Lins, consultor da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI).

Outros sinais são:

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  • Dor abdominal
  • Cãibras
  • Desidratação
  • Baixa circulação de oxigênio no corpo
  • Choque

“Normalmente, a média de tempo desde que se ingere a bactéria até começar a desenvolver os sintomas fica em torno de dois a três dias. Mas isso pode acontecer já em poucas horas, ou, por outro lado, em até cinco dias da ingestão do alimento contaminado”, explica a infectologista Mirian Dal Ben, do Hospital Sírio-Libanês.

Leia também: Tuberculose ainda é um desafio de saúde pública no Brasil

Complicações

Sem o tratamento adequado, a doença pode agravar e provocar complicações devido ao esgotamento do organismo. A desidratação intensa, marcada pela perda excessiva de líquidos em comparação com a ingestão, é capaz de matar.

“Crianças mais novas e idosos são mais vulneráveis à desidratação”, afirma o infectologista da SBI. Além disso, pessoas com doenças crônicas podem ver o quadro ser descompensado pela diarreia da cólera.

Também entram para a lista de pessoas mais vulneráveis às complicações da cólera: diabéticos, desnutridos, pessoas que vivem com HIV e indivíduos com doenças cardiovasculares.

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Leia também: Casos de hanseníase aumentam – e ainda são subnotificados

Como é feito o tratamento da cólera?

Um dos primeiros passos para o tratamento é a reposição de líquidos e sais minerais. Para isso, existem soluções de reidratação oral, que combinam água, açúcar e sais. Para indivíduos em condição mais grave, a reposição de fluidos pode ser feita pela veia.

Por ser uma infecção bacteriana, antibióticos também podem abrandar as manifestações e diminuir a gravidade do quadro. São medicamentos que estão amplamente disponíveis. “Em geral, é utilizado um medicamento chamado doxiciclina“, diz Lins.

Como evitar a cólera

Por ser um problema de saúde complexo, a prevenção contra a cólera deve envolver diversos âmbitos da sociedade.

Ações devem visar desde a garantia do fornecimento de saneamento básico e acesso à água tratada por gestores à conscientização da população sobre os cuidados necessários para a higienização de mãos e preparo de alimentos.

“A prevenção é feita com medidas que diminuem o risco de você ingerir água e alimentos contaminados”, afirma Mirian. Ou seja, só beba água de boa procedência. “Em regiões de risco, por exemplo, recomendamos não tomar água de torneiras ou fontes e evitar bebidas com gelo, por não saber o tipo de preparo”, completa a médica.

No contexto dos cuidados, também são válidas medidas como:

  • Lavar sempre as mãos com água e sabão, principalmente antes de preparar ou comer alimentos
  • A mesma regra vale após o uso do banheiro, de transporte público ou ao tocar em superfícies sujas e em animais
  • Higienizar as mãos sempre que chegar em casa e antes e depois de trocar fraldas
  • Desinfectar superfícies, utensílios e equipamentos usados na cozinha
  • Cuidar dos alimentos, evitando contato de insetos e animais
  • Se não estiver em locais com água filtrada e tratada, é necessário ferver ou colocar duas gotas de solução de hipoclorito de sódio a 2,5% para cada litro de água. É preciso esperar 30 minutos antes de usá-la

Atualmente, existem três vacinas orais contra cólera aprovadas pela OMS: Dukoral, Shanchol e Euvichol-Plus. Todos os imunizantes contam com o esquema de duas doses, mas eles não estão amplamente disponíveis para a população.

A recomendação da OMS é de que as vacinas sejam utilizadas em áreas onde a doença é endêmica, em situações de crises humanitárias que elevem o risco de transmissão e durante surtos.

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