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Gripe aviária: o que a chegada do H5N1 ao Brasil representa para nós?

Para especialistas, risco de pandemia em humanos é baixo no momento. Mesmo assim, situação exige cuidados das autoridades, em especial com aves de criação

Por Chloé Pinheiro
25 Maio 2023, 18h11
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Vírus H5N1 pode ocasionalmente ser transmitido para aves de criação e humanos, com alta mortalidade. (Thomas Iversen - Unsplash/Reprodução)
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Recentemente, o Ministério da Agricultura declarou estado de emergência zoosanitária por conta da chegada do vírus influenza H5N1 ao país.

É a primeira vez que este causador da gripe aviária é detectado no Brasil e, até agora, oito casos foram confirmados em duas espécies de aves silvestres.

O H5N1 é parente dos influenza que circulam entre nós e provocam a gripe. Porém, trata-se de um subtipo especialista em infectar aves. 

“Ele causa infecções esporádicas em humanos, mas o risco é baixo no momento porque não há evidências de que ele esteja adaptado para se transmitir entre nós”, explica a virologista Helena Lage Ferreira, professora da Universidade de São Paulo (USP) e presidente da Sociedade Brasileira de Virologia

O vírus foi detectado pela primeira vez no final dos 1990, na China. De lá, se espalhou para outros países e continentes, por meio das aves silvestres migratórias, e passou por evoluções genéticas. 

“A novidade agora é essa dispersão mais globalizada, inclusive no sul do planeta, onde praticamente não tínhamos casos”, aponta o virologista Fernando Spilki, da Universidade Feevale, no Rio Grande do Sul.

A disseminação rápida nos animais é um sinal de alerta para monitorar de perto o patógeno. 

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H5N1, uma novidade para o Brasil

Cada vez que um vírus se multiplica em um organismo infectado, ele duplica seu material genético, e nessa cópia há a chance de um erro, ou uma mutação, que lhe confere alguma vantagem. 

Em 2020, surgiu na Europa o subtipo que preocupa no momento, por causa de sua capacidade de se espalhar mundo afora e sua patogenicidade – isto é, a habilidade de provocar doença no hospedeiro.

Em 2021, houve a introdução na América do Norte por meio de aves migratórias. 

“Nos Estados Unidos, aves silvestres e domésticas foram infectadas, além de outras espécies de aves migratórias, que vêm para o sul em busca de alimento e locais para reproduzir”, comenta Helena. 

Do norte, o H5N1 seguiu a rota desses pássaros: foi identificado na Venezuela, no Chile e em outros países das Américas. Até chegar ao Brasil.

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Por aqui, foi encontrado em aves residentes do Brasil, que vivem na costa do Espírito Santo e do Rio de Janeiro.

Os casos de H5N1 em humanos 

O vírus influenza no geral é um vírus zoonótico, que infecta seres humanos e outras espécies. Em geral, a família acomete aves e mamíferos como equinos e suínos.

As cepas são especialistas em cada animal. “Mas, de vez em quando, pode acontecer o spillover, que é a infecção de outras espécies”, diz o infectologista pediátrico Renato Kfouri, da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm). 

+ Leia também: De varíola dos macacos a Covid-19: vivemos a era das pandemias?

Isso ocorre tanto de forma ocasional quanto devido a uma evolução do vírus, que se torna apto a circular melhor em outros bichos. O H1N1, por exemplo, surgiu em porcos antes de provocar uma pandemia em humanos em 2009. 

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Casos de gripes aviárias são registrados em humanos desde os anos 1960, sempre de forma esporádica: adoece quem tem contato com animais doentes.

No caso do H5N1, foram 860 casos registrados em 20 países desde 2003, ano em que o vírus ressurgiu na Ásia e se tornou foco dos cientistas. 

A doença é como uma gripe normal mesmo. Só que, no início, chamava a atenção a alta letalidade desses encontros.

“A mortalidade chegava a 80%. Agora, a média histórica está em 50%, mas isso vem caindo ao longo dos anos”, aponta Spilki. 

Nessa dispersão atual na América Latina, um homem chileno e uma criança equatoriana contraíram a doença. Ambos se recuperaram sem maiores problemas. 

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Qual o risco de uma pandemia? 

Como dissemos, até agora o vírus não parece estar se adaptando para circular entre humanos. Para que isso aconteça, ele teria que sofrer alterações em diversos pontos de seu material genético. 

“A boa notícia é que as simulações atuais demonstram que demoraria muito tempo para isso acontecer. Porém, alguns fatores podem acelerar esse processo, como o aumento de casos em humanos ou a infecção de um mamífero, onde o vírus poderia se adaptar mais facilmente”, comenta Spilki.

Caso ele se aproxime demais de nós – por meio das aves domésticas, por exemplo – aí, sim, teríamos uma situação mais favorável para ele.

“O influenza tem um potencial pandêmico muito forte. Antes da Covid-19 surpreender a todos, já era esperado que algum de seus subtipos, inclusive o H5N1, se espalhasse”, reflete Kfouri. 

A capacidade de transmissão entre outros mamíferos é mais um ponto de atenção. O vírus tem sido diagnosticado com certa frequência em mamíferos marinhos – mais de 1 500 leões marinhos morreram neste ano no Chile. 

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Na Espanha, houve um surto de H5N1 em uma criação de martas (visons).

“Nesse caso, foi confirmado que o vírus estava adaptado geneticamente para se transmitir entre mamíferos, mas essas alterações não foram identificadas nos vírus que circulam no nosso continente”, comenta Helena. 

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O cuidado com os animais 

Do ponto de vista individual, ninguém precisa tomar nenhum cuidado extra pensando na gripe aviária.

“Temos que fortalecer nosso sistema de vigilância em relação às aves silvestres e de criações, como frangos e galinhas”, aponta Kfouri. 

O objetivo é evitar o contato das aves migratórias com as que criamos para fins de consumo.

Isso porque um surto entre elas poderia ter efeitos devastadores na economia, no fornecimento de alimentos e aproximaria o vírus do contato humano.

É bom lembrar que muita gente trabalha na cadeia de produção avícola e/ou cria esses animais em casa para subsistência. 

A declaração do estado de emergência zoosanitária pelo Ministério da Agricultura visa exatamente intensificar medidas de segurança e uma cooperação entre governo e sociedade civil para diminuir riscos. 

Entre as decisões, está uma espécie de “distanciamento social” das aves de granja. Galinhas e companhia não podem ser exibidos em feiras ou outras aglomerações por 180 dias.

“E criações, mesmo pequenas, de fundo de quintal, precisam ser cobertas e protegidas do contato com aves silvestres”, orienta Spilki. 

Pessoas em contato com esses animais devem tomar cuidado redobrado com equipamentos de segurança e higienização. 

Já ao encontrar aves silvestres que aparentem estar doentes ou mortas, em especial em regiões litorâneas, o ideal é não se aproximar e chamar uma autoridade, como a vigilância sanitária da cidade. 

E se uma infecção em humanos for confirmada?

Casos de infecção em indivíduos que tiveram contato com aves devem ser adequadamente isolados e tratados, justamente para evitar que se espalhem.

Reforçando: é difícil que o H5N1 provoque uma emergência de saúde pública num futuro breve. 

Se isso ocorrer, já temos algumas vantagens, como uma rede de vigilância e contatos entre instituições fortalecida com a pandemia de Covid-19.

Além disso, conhecemos bem o influenza e sabemos como fazer vacinas contra ele. “Seria uma adaptação simples do imunizante que já temos”, conta Kfouri.

O infectologista ressalta, aliás, que a situação serve como um lembrete para se vacinar contra os vírus influenza que estão entre nós. Esses representam um perigo iminente, e as doses estão sobrando nos postos de saúde. 

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