O cientista que quer frear o envelhecimento
João Pedro de Magalhães quer descobrir o diferencial dos animais mais longevos do planeta - e de que forma podemos reproduzi-lo em nosso organismo
João Pedro de Magalhães é um biólogo português que trabalha na Inglaterra e investiga o que podemos aprender com os genes e o organismo de animais que vivem muito. Pesquisador e líder do Laboratório de Genômica Integrativa do Grupo de Envelhecimento da Universidade de Liverpool, na Inglaterra, ele compartilha nesta entrevista suas ideias sobre as promessas da medicina para conter os efeitos da idade.
O envelhecimento é um processo que pode ser, digamos, curado?
Há um grande debate sobre essa questão, porque o envelhecimento em si não é reconhecido como doença. É algo natural, que acontecerá com todos. Por outro lado, se pensarmos que ele também é prejudicial, pois leva ao aparecimento de doenças – e que podemos intervir para prevenir isso -, então, sim, dá para pensar em uma cura no futuro. É um objetivo que ainda não estamos nem perto de atingir, mas daqui a 50 ou 100 anos, com a evolução da medicina, não há nenhum motivo para não acreditar que seremos capazes de atrasar ou interromper esse processo.
Quais são as tecnologias antienvelhecimento mais próximas de virarem realidade?
Uma linha de pesquisa muito promissora é a dos compostos que manipulam o metabolismo e tentam preservar a saúde pelo maior tempo possível. Algumas já estão sendo testadas em humanos e creio que, num futuro próximo, algo como dez ou 20 anos, conseguirão elevar em até 10% a expectativa de vida de uma pessoa. Nada drástico, mas mesmo pequenos avanços nessa área já terão grande impacto na saúde pública.
Como funcionam esses medicamentos?
Ainda não está muito claro, mas alguns compostos sintéticos e suplementos nutricionais parecem atuar nos sistemas nervoso e hormonal, alterando o metabolismo com estratégias parecidas com as da expansão da vida em animais, caso da restrição calórica. Hoje sabemos que, se reduzirmos o número de calorias sem diminuir nutrientes, a longevidade aumenta significativamente.
Em ratinhos, já se consegue aumentar em 50% a expectativa de vida com a técnica. Mas em seres humanos isso gera estresse e outras reações secundárias. Por isso existem remédios em desenvolvimento que tentam simular esse efeito.
Algumas pessoas vivem muito acima da média. O que há de diferente nelas?
Sabemos que para viver bem durante uns 80 anos fatores como não fumar, comer direito e fazer exercícios são decisivos. Mas, para ter uma longevidade humana excepcional, acima dos 100 anos, a genética passa a ser mais importante.
E, quando analisamos os centenários, vemos que os custos de hospitalização e o tempo que eles ficam doentes antes de morrer são bem menores do que os de uma pessoa que vive até os 80. Eles são o exemplo ideal do que queremos atingir, que é viver muitos anos com boa saúde.
Se a genética influencia tanto o envelhecimento, será possível um dia manipulá-la a nosso favor?
Algumas técnicas já permitem manipular o código genético de animais antes mesmo de eles nascerem, modificando suas células-tronco embrionárias. Existem também novas tecnologias de edição do genoma, para destruir ou silenciar genes específicos, que provavelmente receberão o Prêmio Nobel nos próximos anos.
Mas ainda não há um jeito seguro e prático de manipular os genes humanos, fora o debate ético em torno do assunto. Creio que isso ocorrerá nas próximas décadas, mas o que está mais perto de acontecer é a criação de drogas que interfiram na parte do DNA relacionada ao envelhecimento ou ainda que simulem o comportamento dos genes dos centenários.
Pode contar pra gente o que é a sua linha de pesquisa em envelhecimento?
Sabemos que alguns animais aparentam não envelhecer, como a baleia-da-groenlândia e o rato-toupeira-pelado. As baleias-da-groenlândia nos interessam muito, pois se estima que vivam 200 anos e, mesmo tendo muito mais células que os humanos – e elas poderiam sofrer mutações nesse tempo -, esses animais não morrem de câncer. Então investigamos quais são as características genéticas e os mecanismos metabólicos por trás dessa longevidade e resistência.
Agora planejamos criar ratinhos com genes dessa baleia e avaliar se eles viverão mais e com saúde. Mas isso é uma ideia. Também estamos testando medicações para aumentar a longevidade em experimentos com animais e, graças a colaboradores, temos acesso aos dados genéticos de milhares de pessoas. Assim, há uma outra linha de pesquisa em nosso laboratório para descobrir quais são os genes das doenças relacionadas ao avançar da idade, como o próprio câncer e o Alzheimer.
O senhor acredita que no futuro aumentaremos a expectativa de vida indefinidamente?
Acredito que será um processo natural, da mesma maneira que vem ocorrendo nos últimos tempos. Há menos de 150 anos nós vivíamos até os 40 e hoje chegamos aos 80 em alguns países. Mesmo assim, ainda há um limite onde envelhecemos e morremos e, para ultrapassar essa linha, será preciso ter avanços tecnológicos superiores aos que temos no momento.
Uma dessas possibilidades é a manipulação genética, ou seja, evoluir geneticamente a espécie para viver mais tempo. Contudo, antes disso precisamos entender melhor os mecanismos por trás do envelhecimento. Existem teorias, mas o fato é que ainda não sabemos ao certo por que ficamos velhos.