Inovação e tecnologia ajudam a promover o autocuidado em saúde
Especialista em marketing digital e inteligência artificial fala sobre papel do ecossistema digital no engajamento das pessoas em favor da qualidade de vida

Investir em qualidade de vida, buscar informações confiáveis e adotar medidas capazes de prevenir doenças e se habilitar a lidar com opções para tratar condições menores, a exemplo de dores de cabeça, febre e azia, sem a necessidade de prescrição médica – o conceito de autocuidado definido pela Organização Mundial da Saúde (OMS) vem ao encontro do desejo dos brasileiros de cuidar cada vez melhor de si mesmos, com o apoio de ações governamentais. É o que revela a pesquisa ACESSA/Datafolha realizada em 2024, na qual 97% dos respondentes dizem acreditar que o poder público deve investir em iniciativas voltadas ao autocuidado em saúde.
Iniciativas nesse sentido, aliás, além de bem recebidas pela população, ajudam a reduzir custos e otimizar o sistema público de saúde, cujos recursos podem, então, ser redirecionados para tratamentos mais complexos, ampliando, assim, a capacidade de atendimento de casos graves.
Reconhecida por suas ações em prol do letramento em saúde e uso racional de produtos como Medicamentos Isentos de Prescrição (MIPs), a Associação Brasileira da Indústria de Produtos para o Autocuidado em Saúde (ACESSA) tem o olhar voltado também a inovações com potencial de incentivar o protagonismo de cada brasileiro na gestão da própria saúde. Um exemplo disso é a categoria Soluções Digitais e Tecnologias Inovadoras da edição 2025 do Prêmio Autocuidado em Saúde ACESSA, que está em andamento e apresentará os vencedores no dia 19 de agosto, em cerimônia em Brasília (DF). Para entender melhor o papel dos avanços tecnológicos nesse contexto, entrevistamos Juliana Morais Batista de Lima, uma das juradas dessa categoria.
Graduada em engenharia de alimentos, com formação executiva em marketing digital, IA e data & analytics pela Northwestern Kellogg University, Juliana Lima tem 20 anos de experiência em inovação, marketing, gestão e desenvolvimento de novos produtos e negócios e é investidora anjo e conselheira de startups.
Na entrevista a seguir, a jurada analisa as vantagens e os desafios da aplicação das tecnologias digitais destinadas ao autocuidado, além de apontar as tendências mais promissoras nesse sentido.
Um dos setores mais beneficiados pelos avanços tecnológicos é o de saúde e bem-estar, com cada vez mais produtos digitais disponíveis. Na sua visão, isso tem contribuído para a promoção do autocuidado?
Sem dúvida. O acesso a tecnologias digitais tem ampliado a autonomia das pessoas no cuidado com a saúde, permitindo o monitoramento de hábitos, sinais vitais e até o gerenciamento de condições crônicas de forma mais acessível e personalizada. Aplicativos, wearables e plataformas de telemedicina, por exemplo, dão aos usuários informações confiáveis e ferramentas práticas para adotar hábitos mais saudáveis, prevenir doenças e tomar decisões mais embasadas sobre seu bem-estar. Esse empoderamento digital fortalece o conceito de autocuidado ao colocar a saúde literalmente na palma da mão dos indivíduos.
No entanto, é essencial que essas ferramentas sejam utilizadas de forma crítica e responsável. A dependência excessiva da tecnologia pode levar à autoavaliação imprecisa de sintomas e atraso na busca por assistência profissional quando necessário. Além disso, nem todas as plataformas oferecem informações embasadas cientificamente, o que reforça a importância de escolher fontes confiáveis. Também há o desafio da exclusão digital, já que nem todos têm acesso a essas inovações ou familiaridade com elas. Para que o autocuidado digital seja verdadeiramente eficaz, é fundamental garantir inclusão, alfabetização digital e um equilíbrio saudável entre o uso da tecnologia e a orientação profissional.
De que forma o uso de inteligência artificial e plataformas digitais já vem ajudando na prevenção de doenças e na autogestão da saúde?
A inteligência artificial tem desempenhado um papel essencial na personalização da saúde. Hoje, algoritmos analisam grandes volumes de dados para prever riscos, sugerir intervenções precoces e até auxiliar no diagnóstico médico. Plataformas digitais, por sua vez, permitem um acompanhamento contínuo da saúde do usuário, desde assistentes virtuais que ajudam a lembrar o horário de medicamentos até sistemas que interpretam exames e fornecem recomendações baseadas no histórico do paciente. Essas inovações não apenas facilitam a prevenção, como também promovem a educação em saúde, incentivando escolhas baseadas em mais informações e assertivas.
Quais as principais tendências nesse sentido? O que podemos esperar para o futuro do autocuidado com o apoio da tecnologia?
Entre as tendências mais promissoras discutidas na última edição do SXSW, em 2025, destaco a evolução dos dispositivos vestíveis (wearables), que irão além do monitoramento de batimentos cardíacos e sono, incorporando sensores cada vez mais avançados para detecção precoce de doenças. Sensores em miniatura poderão medir marcadores inflamatórios no organismo em tempo real, permitindo identificar doenças antes que os sintomas apareçam e oferecendo dados personalizados sobre a resposta do corpo a diferentes tratamentos.
Além disso, a IA generativa promete revolucionar a interação com a saúde, proporcionando assistentes ainda mais inteligentes e personalizados. Outra inovação em destaque é o avanço na modelagem de células virtuais, que pode acelerar a descoberta de tratamentos e prever com mais precisão como cada organismo responderá a diferentes intervenções médicas. Isso reduziria o tempo e os custos do desenvolvimento de novos medicamentos e permitiria abordagens mais personalizadas no cuidado à saúde.
Por fim, a integração de plataformas de saúde com dispositivos do dia a dia tende a crescer, criando um ecossistema digital em que diferentes tecnologias trabalham juntas para promover o bem-estar. No futuro, veremos ferramentas cada vez mais acessíveis, intuitivas e proativas, tornando o autocuidado parte natural da rotina das pessoas.
Quais são os principais desafios para ampliar o acesso às inovações e suas funcionalidades?
Um dos desafios centrais é garantir que essas inovações sejam acessíveis a toda a população, reduzindo desigualdades no acesso à saúde digital. Isso envolve desde políticas públicas que incentivem a conectividade e a inclusão digital até o desenvolvimento de soluções mais intuitivas e culturalmente adaptadas à diversidade dos usuários.
Outro ponto crítico é a proteção de dados: na medida em que as tecnologias avançam, é essencial que haja um equilíbrio entre inovação e segurança, garantindo que as pessoas possam confiar nessas ferramentas e se beneficiar delas sem riscos à privacidade. Além disso, há um desafio técnico relevante na geração de dados de qualidade. Modelos de inteligência artificial dependem de bases de dados extensas e diversificadas para serem realmente eficazes, e a falta de informações representativas pode comprometer a precisão e aplicabilidade dessas tecnologias na prática.
Por fim, como você avalia o papel de uma premiação como a da ACESSA na disseminação dos conceitos de autocuidado?
Premiações como a da ACESSA são fundamentais para valorizar soluções inovadoras que impactam positivamente a saúde da população e lhes dar visibilidade. Além de reconhecer o trabalho de profissionais e empresas que desenvolvem tecnologias voltadas ao autocuidado, a premiação ajuda a ampliar a conscientização sobre a importância desse tema. Em um cenário em que o acesso à informação e à tecnologia pode transformar vidas, destacar iniciativas que promovam a autonomia e o bem-estar dos indivíduos é essencial para acelerar mudanças positivas na sociedade.