O câncer de mama surge com frequência em mulheres a partir dos 50 anos de idade. Estima-se que somente 10% dos casos aconteçam antes dos 40 anos. Mas, mesmo sendo a minoria, as pacientes mais novas existem – e precisam de cuidados específicos. Aproveitando a campanha do Outubro Rosa, a leitora Stephany Monteiro, uma jovem em tratamento contra o câncer, nos pediu, pelo Instagram da Veja SAÚDE, para falarmos justamente sobre essas especificidades.
Para tirar todas as dúvidas, conversamos com dois oncologistas especialistas nesse tipo de tumor: Felipe Ades, do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, em São Paulo, e Rafael Kaliks, do Hospital Israrelita Albert Einstein, também na capital paulista, e diretor científico do Instituto Oncoguia.
Primeiro, é preciso esclarecer por que o câncer de mama costuma ser mais incidente após a quinta década de vida. De acordo com Felipe Ades, essa é a tendência para a maior parte dos tumores, já que eles são resultado de mutações genéticas provocadas por vários fatores (sedentarismo, obesidade, tabagismo, abuso de álcool etc.). “A possibilidade de adquirir essas mutações é maior quando se tem mais tempo de vida”, raciocina.
Então, o que leva alguém a desenvolver a doença no auge da juventude? “Frequentemente, ela é consequência de uma predisposição genética hereditária”, responde Kaliks.
A agressividade
Essa é a principal distinção entre a doença nas duas faixas etárias. “É comum mulheres jovens terem cânceres mais agressivos”, afirma Ades.
Só que isso não está relacionado à idade em si, mas ao tipo do tumor mais frequente abaixo dos 40 anos: o triplo-negativo. Ele cresce e se espalha mais rápido que outros subtipos.
O tratamento
Como os cânceres entre mulheres jovens e mais maduras são, em geral, diferentes, o tratamento também varia. Kaliks explica que, na terceira idade, os tumores de mama mais recorrentes são do tipo receptor hormonal positivo. “Para tratá-los, utilizamos a hormonioterapia”, ensina.
No caso do triplo-negativo, há a opção de remoção por meio de cirurgia quando o diagnóstico ocorre no início. Para quadros mais avançados, até pouco tempo atrás saída era basicamente a quimioterapia, com um eventual apoio da radioterapia. Recentemente, chegou ao Brasil o primeiro medicamento imunoterápico para esse tipo de tumor – mas ele ainda não está na rede pública.
E, mesmo após o tratamento, é essencial acompanhar a jovem de perto. “O risco de sofrer uma recidiva [o retorno do câncer] no futuro é maior”, informa o oncologista do Einstein. Para reduzir essa probabilidade, é necessário realizar a terapia nas duas mamas, mesmo que a neoplasia tenha sido encontrada em apenas um lado.
Ades acrescenta que a expectativa de vida das jovens permite que sejam realizados mais tratamentos e por um período maior. “E elas toleram melhor os efeitos colaterais”, complementa Kaliks.
Outro ponto que merece ser citado é a possibilidade de gravidez. Veja: independentemente do tipo de tratamento, não é recomendado engravidar, pois há riscos para o feto. Na hormonioterapia o perigo é ainda maior, já que ela dura bem mais tempo — cinco anos ou até mais.
Se a mulher não chegou à menopausa, essa é uma preocupação entre os médicos. “É preciso conversar sobre o assunto antes de iniciar a terapia. Algumas pacientes decidem interromper o tratamento para ter um bebê e outras congelam os óvulos para engravidar depois”, relata Ades.
Os exames
O procedimento mais lembrado quando se fala em câncer de mama é, claro, a mamografia. Ades conta que ela reduz a mortalidade em 30%, já que permite o início do tratamento em fases mais iniciais.
“Apesar de ser extremamente importante, existe uma limitação técnica relacionada à forma como a imagem do resultado é gerada, em especial nas mulheres jovens”, pondera. Entenda: a imagem é produzida pelo contraste do tecido glandular da mama e o de sustentação.
Ocorre que, nas jovens, a mama costuma ser mais densa, e isso prevalece na imagem do exame, deixando-a toda branca. “Em outras palavras, é difícil interpretar uma mamografia de alguém com menos de 40”, traduz o oncologista do Oswaldo Cruz. Por isso, a avaliação dessas pacientes é baseada também em outros exames de imagem, como ultrassonografia e ressonância.
Conforme as mulheres envelhecem, as glândulas vão se atrofiando e o tal contraste da mamografia melhora.
O rastreamento
No Brasil, o Ministério da Saúde recomenda que, a partir dos 50 anos, toda a população feminina faça mamografia a cada dois anos para rastrear a doença. Algumas sociedades médicas brasileiras, por outro lado, orientam que esse rastreamento comece antes, com 40 anos, e que seja realizado anualmente.
Não existe indicação oficial de mamografia de rastreamento ou qualquer outro exame com esse objetivo para quem tem menos de 40 anos. “A não ser que haja alguma queixa. Mas, nessa situação, não se trata de rastreamento, e sim de diagnóstico”, diferencia Kaliks.
Entretanto, ele explica que, nas jovens com forte histórico familiar, os médicos tendem a iniciar o rastreamento por volta dos 25 anos, com ressonância e ultrassom. Quando elas chegam aos 30, dependendo da densidade das mamas, já dá para começar a fazer mamografia.
“Mas a população que sabe da sua predisposição genética hereditária é muito pequena”, ressalta o diretor científico do Oncoguia.
A prevenção é para todas
“Os dois maiores fatores de risco para o câncer de mama não são modificáveis: ser mulher e envelhecer”, nota Ades. Ainda assim, de acordo com o Instituto Nacional do Câncer (Inca), ao menos 30% dos casos podem ser evitados aderindo a um estilo de vida saudável.
Por isso, a despeito da idade, invista em uma alimentação balanceada, pratique exercícios físicos regularmente e passe longe de álcool e cigarro. A saúde das mamas não é a única que será resguardada.