A Substância: uma reflexão sobre ego, pressão social e saúde mental
Um dos destaques do Oscar 2025 não é apenas um filme de terror psicológico, mas um espelho incômodo da sociedade atual

O filme A Substância, estrelado por Demi Moore e indicado ao Oscar, tem gerado debates intensos sobre os impactos da busca incessante por validação e pertencimento.
Com uma crítica social contundente, o longa explora como a pressão estética e os padrões inalcançáveis de perfeição transformam seres humanos em produtos descartáveis.
De maneira perturbadora, a história expõe o que acontece quando o ego se torna refém das ilusões sociais e é inserido em uma sociedade doente, onde quem dita as normas, nos define como objetos a serem consumidos e descartados.
Convencidos de que precisamos nos tornar versões melhores de nós mesmos o tempo todo, somos levados a extremos, reproduzindo contra nós mesmos violências que, de tão romantizadas, não são mais percebidas por nós como tais, afinal foram e continuam sendo completamente normalizadas.
Na história em questão, Elisabeth Sparkle, personagem de Demi Moore, recorre a um tratamento revolucionário para rejuvenescer, mas acaba enfrentando consequências devastadoras.
Psicologicamente falando, essa metáfora representa como o ego, quando excessivamente inflado pela necessidade de aprovação externa, pode se tornar uma força destrutiva. No filme, ele mostra que é capaz de matar o que resta de sua origem, essência e verdade. Neste extremo, o ego se perde e se consome a tal ponto que não lhe resta mais nenhuma conexão com sua humanidade saudável.
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Outro ponto levantado pelo filme e que não passa despercebido é o papel da indústria da beleza na imposição de padrões e na manipulação do desejo de aceitação.
Esse ciclo vicioso reflete a forma como muitas pessoas acabam adoecendo em nome de uma perfeição inatingível. Procedimentos estéticos cada vez mais invasivos são promovidos como essenciais, levando a consequências que vão desde transtornos psicológicos até complicações médicas graves.
A Substância incomoda porque escancara uma realidade que já existe, mas muitas vezes é ignorada.
De forma inteligente, o filme é um alerta sobre os impactos de uma cultura que coloca o valor humano à mercê de interesses comerciais e sociais, sem considerar os danos que isso nos causa e, infelizmente, o preço que estamos pagando por essa ignorância, que é alto demais.
Enquanto romantizamos e normalizamos tais violências psicológicas, assim como na cena final do filme, não deveríamos nos espantar ao perceber que estamos todos com as mãos sujas de sangue.
Sangue de todas as pessoas que, em busca de sua inexistente versão perfeita, adoeceram física e mentalmente, e daquelas que perderam suas vidas em procedimentos estéticos que nos convenceram serem essenciais.
Acima de qualquer coisa, o longa convida o público a uma reflexão urgente sobre os padrões irreais de beleza e a sede desenfreada por aceitação. E pergunta que não quer calar dentro de mim depois de assistir é: será mesmo que precisamos de tudo isso?
Por fim, acredito que A Substância não é apenas um filme de terror psicológico, mas um espelho incômodo da sociedade atual.
Ele nos convida a repensar nossos valores, reconhecer as pressões que nos cercam e, principalmente, resgatar nossa humanidade antes que ela seja completamente consumida pela busca incessante pela perfeição.
*Fabiana Guntovitch, psicanalista e especialista em comportamento