O respeito à diversidade de orientação sexual e de gênero é uma conquista recente, que requer constante vigilância e atenção de todos. De nossa parte, acredito que a medicina deve exercer um papel fundamental nessa conquista, em especial no que tange aos cuidados que os profissionais devem dedicar a essa população.
Antes, alguns esclarecimentos sobre a sigla. Para quem não sabe, “LGB” se refere à orientação sexual e significa lésbicas, gays e bissexuais; “TQI” corresponde à identidade de gênero: transexuais, queer e intersexo; o “A” se refere a assexuais; e o sinal de “+” engloba pessoas não binárias, pansexuais e demais identidades.
Muito além da sigla, sempre aberta a incluir, essas pessoas merecem, como qualquer cidadão ou cidadã, a atenção especial dos integrantes dos serviços de saúde e a compreensão de suas particularidades.
Esse é um assunto que não pode mais passar batido pela ginecologia e a obstetrícia, por exemplo. Não à toa, a 14ª edição do livro Rezende Obstetrícia (clique para comprar), manual destinado a profissionais da área editado pela primeira vez pelo médico Jorge Rezende em 1961, traz um capítulo especial a essa questão.
Entre conceitos, ensinamentos e sugestões, a obra lembra que os profissionais devem tratar os pacientes pelo seu nome e pronome de escolha. O atendimento às pessoas trans precisa ser multidisciplinar e contar com vários especialistas, entre eles psicólogos e psiquiatras.
+ LEIA TAMBÉM: A saúde mental da população LGBTQIA+
Anamnese e exame físico devem ser realizados respeitando-se as peculiaridades de cada indivíduo. Por exemplo: a rotina ginecológica para mulheres que fazem sexo com mulheres é idêntica à da população geral. A colpocitologia oncótica, que rastreia lesões no útero, deve ser realizada em todas as pessoas com esse órgão, seguindo o calendário estabelecido para a população geral, assim como a mamografia.
Em relação à parentalidade LGBTQIA+, a experiência é complexa, envolve fatores biológicos, psicológicos, sociais e culturais e apresenta significados e percursos distintos em cada sociedade. As famílias podem se configurar de múltiplas maneiras (monoparentais, homoparentais, adotivas…) e inclusive ser recompostas.
Diante desse cenário, os centros de reprodução assistida devem considerar as particularidades do atendimento aos indivíduos e às famílias LGBTQIA+, que podem buscar serviços diversos como doação de esperma, inseminação intrauterina ou fertilização in vitro.
Na assistência pré-natal, são mantidos os protocolos de exames, vacinação, número de consultas e acompanhamentos em geral. Cabe ressaltar que casais LGBTQIA+ podem ser atendidos no âmbito da assistência pré-natal a despeito de suas configurações, o que inclui homens e mulheres transexuais e casais homoafetivos.
A assistência ao parto também deve contemplar essa diversidade, evitando-se a intersecção da violência obstétrica. Essas famílias merecem ser respeitadas em seus arranjos, e nunca devem ser questionadas com perguntas inconvenientes ou comentários preconceituosos.
BUSCA DE MEDICAMENTOS
Consulte remédios com os melhores preços
Nessa linha, também se deve respeitar o direito ao acompanhante de escolha da pessoa gestante. E é preciso contemplar a possibilidade de outra pessoa, além daquela que teve o parto, amamentar, o que pode envolver não apenas duas mães, mas combinações diversas de casais transexuais. Hoje existem protocolos específicos de indução da lactação em pessoas não gestantes.
Auxiliar e orientar famílias na aceitação e na compreensão de seus membros LGBTQIA+ tem impactos importantes na vida de todos os envolvidos. Essas pessoas têm os mesmos direitos de qualquer cidadão, apenas possuem particularidades que precisam ser respeitadas, inclusive na gestação, no parto e no pós-parto.
Eis um compromisso que a medicina deve abraçar; e a nova literatura médica, propagar.
* Jorge Rezende Filho é professor titular da cátedra de Obstetrícia e Ginecologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e membro da Academia Nacional de Medicina