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Tá na internet, tá na TV, tá nos livros... tá no nosso dia a dia. O jornalista André Bernardo mostra como fenômenos culturais e sociais mexem com a saúde — e vice-versa.

Alzheimer: o elemento pouco falado de Ainda Estou Aqui

Livro que inspirou filme conta detalhes da luta de Eunice Paiva contra a condição que afeta 1,2 milhão de brasileiros

Por André Bernardo
5 mar 2025, 14h06
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Fernanda Montenegro interpreta Eunice Paiva no fim da vida no filme Ainda Estou Aqui  (Alile Dara Onawale/Divulgação)
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No livro Ainda Estou Aqui (Alfaguara – clique para comprar*), Marcelo Rubens Paiva compara o Alzheimer a uma visita indesejada – daquelas que sobem pelo elevador sem serem anunciadas na portaria.

Da primeira vez que ouviu o barulho da campainha, o escritor tomou um susto. “De onde você tirou isso?”, riu, surpreso, quando uma amiga perguntou: “Sua mãe tem Alzheimer?”. Antes disso, Ana Lúcia Paiva, a Nalu, uma de suas quatro irmãs, já tinha reparado o quanto a mãe andava confusa com algo até então banal: contas a pagar. “Mamãe está tão estranha…”, deixou escapar.

Certa vez, a vizinha da porta da frente encontrou Eunice Paiva, mãe de Marcelo, parada no corredor do prédio onde moravam. O elevador chegou, a vizinha desceu, e Eunice continuou lá, imóvel. Ah, detalhe: estava de camisola! “Sua mãe não está bem”, avisou para Marcelo e suas irmãs. Noutra ocasião, Eunice comprou duas televisões quando não precisava de nenhuma.

O que eu vim mesmo fazer aqui?”, perguntou no caixa da loja. “Comprar uma TV”, respondeu a vendedora. Foi ao balcão e comprou mais uma: a terceira.

Sim, Eunice Paiva, que agora ganhou fama mundial, travou duas longas batalhas: uma contra a ditadura; outra contra o Alzheimer. As duas estão descritas no livro Ainda Estou Aqui, que virou longa-metragem pelas mãos talentosas do cineasta Walter Salles e ganhou o Oscar de Melhor Filme Internacional.

Na manhã do dia 20 de janeiro de 1971, seu marido, o engenheiro civil e deputado federal cassado Rubens Paiva, saiu de casa para depor e nunca mais voltou. Seu corpo jamais foi encontrado.

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Dona de casa, Eunice se viu sozinha para criar os cinco filhos do casal: Vera, Eliana, Ana Lúcia, Marcelo e Beatriz, com idades entre 10 e 16 anos. Com as contas bloqueadas, precisou fazer outra faculdade. Passou em primeiro lugar para Direito.

Não descansou enquanto não conseguiu tirar a certidão de óbito do marido. Era o dia 23 de fevereiro de 1996. “Ela ergueu o atestado como um troféu”, recorda o escritor. “Foi naquele momento que descobri: ali estava a verdadeira heroína da família”.

A segunda batalha

Marcelo não sabe dizer quando teve início a luta de sua mãe contra o Alzheimer.

São 14 os fatores de risco, lista a geriatra Celene Pinheiro, presidente da Associação Brasileira de Alzheimer (ABRAz): baixa escolaridade, perda auditiva, hipertensão, obesidade, diabetes, sedentarismo, colesterol alto, tabagismo, consumo excessivo de álcool, perda visual, traumatismo craniano, depressão, isolamento social e poluição.

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+Leia também: 10 fatores que pesam na prevenção da demência

O autor se orgulha da saúde invejável da mãe: nunca ficou doente, lia sem parar, fazia tudo a pé, nadava no mar de Búzios… No entanto, foi presa e interrogada no DOI-Codi, o maior centro de tortura da América Latina, por 12 dias: de 21 de janeiro a 2 de fevereiro de 1971.

“As famílias das pessoas mortas pelo regime militar sofreram imensamente por períodos longuíssimos. Não sabiam se o seu ente querido estava vivo ou morto. Mais do que isso: temiam pela própria vida e pela dos demais membros da família. Todo esse sofrimento traz graves consequências para a saúde mental”, afirma a médica.

No livro, Marcelo Rubens Paiva repete a palavra Alzheimer 34 vezes. A primeira delas na página 18 e a última, na 261.

Entre uma e outra, chama a condição de “doença do esquecimento”, critica o uso do substantivo “mal” na frente do nome da doença (“Toda vez que alguém diz: ‘Sua mãe tem mal de Alzheimer’, eu corrijo: ‘Ela tem Alzheimer’”) e explica que Alzheimer é, na verdade, o sobrenome do primeiro médico a descrever a patologia: o psiquiatra alemão Alois Alzheimer, em 1906 (“Muitas velhinhas gagás, esclerosadas do passado, tinham Alzheimer”).

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Por fim, enumera algumas dicas dadas por um amigo da família, o médico oncologista Drauzio Varella, como usar uma pulseira de identificação, limitar suas opções de escolha, tirar os tapetes da casa, estimular o convívio familiar e, se possível, providenciar ajuda profissional.

+Leia também: Alzheimer: 7 dicas para se comunicar com alguém com demência

Um problema comum

O Alzheimer atinge hoje, segundo estimativa da Associação Internacional de Alzheimer (ADI, na sigla em inglês), 55 milhões de pessoas no mundo. Estima-se que, em 2030, serão 82 milhões e, 20 anos depois, 152 milhões.

No Brasil, o número atual de pacientes é de 1,2 milhões. O Alzheimer é uma condição neurológica degenerativa progressiva que consiste na perda de memória e outras habilidades cognitivas, como linguagem, concentração e raciocínio.

De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), o Alzheimer é responsável por até 75% dos casos de demência. Em pessoas com mais de 85 anos, o percentual de incidência chega a 25%. Uma curiosidade: mulheres têm até três vezes mais chances de desenvolver Alzheimer do que os homens.

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Entre outros sintomas, o paciente com Alzheimer não se lembra do que aconteceu no dia anterior, repete as mesmas perguntas várias vezes, esquece o que está prestes a fazer e perde objetos com frequência acima do normal.

+Leia também: Problemas de memória: como saber se pode ser Alzheimer?

Alzheimer não tem cura, mas tem prevenção. A principal estratégia é evitar ou tratar fatores de risco como tabagismo, obesidade e doenças crônicas não controladas, em especial hipertensão e diabetes.

“Praticar atividade física, manter a mente ativa e promover a vida social são medidas de prevenção”, observa o neurologista Adalberto Studart Neto, da Academia Brasileira de Neurologia (ABN). “Podem reduzir as chances do problema surgir ou, pelo menos, adiar sua evolução”.

Quando Marcelo Rubens Paiva lançou Ainda Estou Aqui em 2015, Eunice Paiva estava viva. “A coisa que eu mais admiro nela e tento levar como um exemplo para a minha vida: ela nunca sentiu pena de si”, relata o filho e autor.

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Eunice Paiva morreu três anos depois, no dia 13 de dezembro de 2018, aos 86 anos.

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