Embora seja um sonho para muitas pessoas, a gestação provoca uma mudança na rotina que pode dificultar a prática de exercícios. Segundo um estudo de pesquisadores brasileiros, as mulheres levam até quatro anos para retornar à atividade física após a gravidez.
O trabalho reuniu cientistas da Universidade Federal de Pelotas, no Rio Grande do Sul, e da Universidade de Queensland, na Austrália, em uma parceria com a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco). Ele compilou dados de 4 mil moradoras de Pelotas, que foram acompanhadas desde 2015. Todas entraram no levantamento a partir da 16ª semana de gestação.
Ao fim da análise, foi constatado que, no segundo trimestre de gravidez, 15,7% das mulheres realizavam algum esforço físico no tempo livre. Já no primeiro ano de vida dos bebês, esse número caiu quase pela metade (7,9%). Ele voltou a subir para patamares próximos do início da gestação (16,8%) quando as crianças faziam 2 anos.
Os experts não tiveram acesso à frequência de atividade física em períodos anteriores à gravidez. Mas, baseados em estimativas gerais, eles acreditam que cerca de 20% eram ativas nessa época. Esse patamar só foi alcançado quatro anos após a gestação, quando 23,2% das participantes reportaram se exercitar no tempo livre.
De acordo com o profissional de educação física brasileiro Grégore Iven Mielke, professor da Universidade de Queensland que assina a investigação, um dos motivos por trás dos resultados é o tabu que ainda existe em relação à segurança de suar a camisa nessa fase da vida.
Mas persiste também a ideia ultrapassada de que o dever de cuidar dos filhos pertence apenas à mãe. “Como as crianças demandam cuidados, não sobra tempo para a atividade física”, analisa o especialista.
Além disso, uma questão socioeconômica foi escancarada no artigo: a porcentagem de mulheres que voltaram à ginástica no pós-parto era maior entre as que possuíam mais anos de estudo. “Isso reforça que praticar atividade física não é simplesmente uma escolha pessoal. Existem outros fatores que influenciam nessa decisão”, comenta Mielke.
Entre as limitações do estudo, os autores indicam que as informações obtidas sobre a atividade física se basearam em questionários respondidos pelas próprias participantes, não por uma medição direta. E sempre há o risco de elas se enganarem.
“Outro ponto é que o estudo se concentrou em apenas uma cidade de porte médio no Sul do Brasil”, diz Mielke. “Mas as mulheres foram selecionadas de maneira rigorosa, então acredito que, se ele fosse replicado em outros lugares do país, as conclusões não seriam muito diferentes”, complementa.
Os riscos da falta de exercício na gestação e no pós-parto
Diversos trabalhos comprovam que malhar nesse período traz benefícios para a mãe. Entre eles, destaca-se a prevenção de diabetes gestacional, pré-eclâmpsia e depressão pós-parto. Já o bebê corre um risco menor de apresentar obesidade no futuro.
“As evidências sugerem que os exercícios também são importantes para a saúde mental da mulher no puerpério”, afirma Mielke.
E dá, sim, para mexer o corpo com segurança nessa fase da vida, desde que sejam seguidos alguns cuidados básicos, como mostramos nesta matéria.
Para estimular a atividade física na gestação e nos primeiros anos depois dela, não basta bater na tecla da força de vontade. “É preciso mudar o entendimento de que a responsabilidade pela criança é só do sexo feminino “, constata Mielke.
Investimentos públicos em espaços acessíveis e seguros para a prática de esportes e na divulgação de informações confiáveis são outros pontos relevantes.
“Essa não é uma tarefa apenas da mulher, mas coletiva e familiar. Há uma necessidade de construir uma rede de apoio e de políticas públicas”, finaliza o especialista.