Desajuste evolutivo. É assim que alguns cientistas e teóricos interpretam o descompasso entre a evolução biológica e a evolução cultural, que responde por uma legião de problemas de saúde da nossa era.
Resumindo a aula de professores como Daniel Lieberman, da Universidade Harvard (EUA), a sociedade e os hábitos do Homo sapiens se transformaram rápido demais à luz do relógio darwiniano, num ritmo intenso e vertiginoso que o corpo humano, desenhado para um mundo com pouca oferta de comida e muito trabalho para consegui-la, não acompanhou.
Herdamos um organismo que gosta de economizar energia. E que, por isso, hoje curte ficar no sofá, empunhando um celular e devorando guloseimas.
Em escala industrial, as mudanças tecnológicas e comportamentais moldaram um planeta que conspira há algumas décadas para o homem engordar. Culpa de quem? Vai saber, e essa é uma pergunta irrelevante.
O que interessa é entender como podemos minimizar esse tal desajuste que cobra seu preço na moeda da saúde. Não é de hoje que se fala numa pandemia de obesidade.
Apesar dos avanços na conscientização e na mobilização a respeito, que englobam governos, centros de pesquisas, empresas e organizações civis, o mundo continua cada vez mais pesado. E, cruel, ainda pode culpar o cidadão acima do peso pelo seu estado fora do padrão estético e de conveniência social.
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O duro é que a obesidade, encarada como problema crônico de saúde, encurta a qualidade e a expectativa de vida desses milhões de pessoas cujo corpo, por diversas razões, passou a estocar gordura em excesso.
Sim, eis um dos capítulos mais complexos da história da nossa espécie. Não só pela dificuldade de romper o desajuste evolutivo dentro de um sistema que, inadvertidamente, se empenhou para financiá-lo, mas também pelos estigmas e preconceitos, muitas vezes inconscientes, que rondam quem convive com a obesidade.
Felizmente, a sociedade está acordando e cobrando uma nova postura para encarar, com a devida ciência e respeito, o excesso de peso.
Especialistas passaram a adotar novas formas de analisar e classificar a condição — mais sensíveis e alinhadas aos estudos —, enquanto laboratórios desenvolvem e lançam remédios com uma potência à altura do desafio.
No entanto, como explica a primeira reportagem de capa da jornalista Ingrid Luisa em VEJA SAÚDE, ainda precisamos progredir bastante para superar a gordofobia, a obsessão por modismos e padrões ilusórios e a falta de preparo dos profissionais e do sistema de saúde para tratar os milhões de brasileiros com obesidade.
Essa tem de ser uma evolução urgente.