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O enigma do autismo: mais casos ou apenas mais diagnósticos?

Em meio a debates sobre prevalência e causas do autismo, genética ajuda a diferenciar mito da realidade e a traçar novas estratégias de saúde

Por Paulo Victor Zattar Ribeiro, médico geneticista, e Muitos Somos Raros*
25 set 2025, 09h47
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Robert F. Kennedy Jr, secretário de saúde dos Estados Unidos, anunciou que pretende identificar as "verdadeiras causas" do autismo (Alex Wong / Equipe/Getty Images)
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As taxas de autismo nunca estiveram tão altas. Nos Estados Unidos, dados mais recentes do Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) apontam que 1 em cada 31 crianças de oito anos foi diagnosticada com transtorno do espectro autista (TEA) em 2022. Em nove dos 11 locais avaliados pela vigilância epidemiológica, houve crescimento consistente, de ao menos 22%, nos diagnósticos.

Globalmente, meta-análises mostram a mesma tendência. A prevalência mundial estimada passou de 0,25% (1994–1999) para 0,99% (2015–2019), ou seja, de 1 em 400 para 1 em 100. O estudo Global Burden of Diseases 2021 calcula que 1 em cada 127 pessoas no mundo está no espectro autista. Ainda assim, especialistas reforçam: não se trata de uma epidemia.

Um artigo publicado na Nature destaca que o crescimento está muito mais ligado à ampliação dos critérios diagnósticos, ao aumento da conscientização e à redução do estigma do que a um aumento real de casos.

+Leia também: EUA vão mesmo descobrir as causas do autismo até setembro?

O que mudou no diagnóstico

Até os anos 1980, o autismo era diagnosticado apenas em quadros graves, frequentemente associados a deficiência intelectual. Hoje, a definição abrange um espectro muito mais amplo, incluindo casos leves, adolescentes e adultos que antes passavam despercebidos.

Essa mudança, somada a políticas de rastreamento e campanhas de conscientização, fez os números dispararem.

“Não se trata de um surto, mas de uma nova lente com a qual estamos olhando para o mesmo fenômeno”, explica o artigo.

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A genética no centro da discussão

A ciência aponta que o principal fator de risco para o transtorno do espectro autista (TEA) é genético, com estimativas de herdabilidade poligênica em torno de 80%. Isso significa que, na maioria das vezes, a condição é explicada por alterações genéticas herdadas ou que surgem de novo.

Estudos recentes publicados em 2025 reforçam essa conclusão. Um trabalho no Journal of Clinical Psychiatry revisou os fatores de risco para o autismo e destacou a predominância da carga genética. Fatores ambientais, como idade parental avançada, infecções na gestação e exposição à poluição, exercem influência menor, mas relevante.

+Leia também: “Infelizmente, o tratamento do autismo virou um grande negócio”

O papel da investigação genética

De acordo com a Sociedade Americana de Genética Humana, todo paciente com suspeita de autismo deve ser avaliado geneticamente, com prioridade nos casos sindrômicos, em que o mesmo vem acompanhado de outras alterações clínicas, como malformações ou epilepsia.

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Ferramentas como microarray genômico e sequenciamento de nova geração (painéis, exoma e genoma) permitem identificar variantes responsáveis em até 30% dos casos.

No Brasil, no entanto, o acesso a esses testes ainda é desigual. Em muitos estados, famílias enfrentam longas filas ou precisam recorrer à rede privada. Essa disparidade regional compromete a possibilidade de oferecer aconselhamento genético adequado e limitar riscos em futuras gestações.

Os riscos da desinformação

Especialistas alertam para os riscos de interpretações distorcidas sobre o aumento dos diagnósticos. Nos Estados Unidos, políticos chegaram a sugerir, sem respaldo científico, que vacinas ou toxinas estariam por trás do fenômeno. A repetição dessas ideias, já refutadas pela comunidade científica, pode gerar desinformação e estigma.

Por outro lado, o crescimento dos números traz também uma faceta positiva: mais pessoas estão recebendo diagnóstico, acesso a terapias e reconhecimento social. Para muitas famílias, isso significa menos invisibilidade e mais acolhimento.

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O que esperar daqui para frente

O futuro da pesquisa aponta para maior refinamento no diagnóstico, integração da genética com neuroimagem e, em alguns casos, perspectivas de terapias-alvo. Para além dos avanços científicos, o desafio será garantir acesso equitativo a testes, acompanhamento multidisciplinar e políticas públicas que ofereçam suporte às famílias em todo o país.

O aumento dos diagnósticos de autismo não deve ser visto como uma ameaça, mas como um reflexo de progresso. Quanto mais cedo a identificação, maior a chance de intervenções que melhoram a qualidade de vida.

Neste momento de intensa discussão, é essencial reforçar que:

  • O crescimento reflete mudanças nos critérios e maior conscientização, não um surto real da condição;
  • A genética é o principal fator de risco, mas fatores ambientais também merecem atenção;
  • A investigação genética é fundamental, sobretudo em casos sindrômicos, mas idealmente deve ser ofertada a todos;
  • Conscientização e políticas públicas são a chave para transformar números em cuidado efetivo.
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  • Paulo Victor Zattar Ribeiro é médico geneticista, fellow em Oncogenética pela USP-Ribeirão Preto e fundador do podcast Pod Raros. 

Essa matéria foi produzida por uma parceria exclusiva entre a VEJA SAÚDE e o Portal Muitos Somos Raros, maior plataforma brasileira independente dedicada às doenças raras — e a maior comunidade de pacientes e famílias raras do País.

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