Relâmpago: Revista em casa a partir de 9,90
Imagem Blog

Pensata

Materia seguir SEGUIR Seguindo Materia SEGUINDO
O economista Mohamed Parrini, mestre em filosofia e CEO do Hospital Moinhos de Vento, em Porto Alegre, examina os progressos e desafios do ecossistema de saúde.

A OMS sem os Estados Unidos: o que está em jogo para a saúde global?

Uma reflexão sobre como decisões tomadas pelo governo americano podem reverberar na saúde pública — e tão conectada

Por Mohamed Parrini
21 mar 2025, 14h15
nova-oms-sem-eua
Equilíbrio sanitário global: riscos à vista com saída de EUA e Argentina (Ilustração: Felipe Del Rio/Veja Saúde)
Continua após publicidade

Vivemos a história diariamente. E há momentos em que as mudanças são tão abruptas que conseguimos perceber que o mundo que conhecemos parece estar se desmanchando e se tornando algo completamente diferente.

Desde meados do século 20, a sociedade testemunhou a criação de organismos internacionais como a Organização das Nações Unidas (ONU), a Organização Mundial da Saúde (OMS) e a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN).

Essas instituições foram estabelecidas com o objetivo de promover a paz, a segurança e a cooperação internacional, buscando evitar a repetição dos horrores do passado.

A ONU, fundada em 1945, emergiu como um fórum para a resolução pacífica de disputas e promoção dos direitos humanos. A OTAN, formatada em 1949, buscava garantir a segurança coletiva dos países-membros diante de ameaças externas.

Já a OMS iniciou suas atividades em 7 de abril de 1948, data celebrada anualmente como o Dia Mundial da Saúde, com a missão de coordenar esforços no combate às doenças e na melhoria das condições sanitárias globais.

Recentemente, participei de um evento em Barcelona, na Espanha, onde pude ouvir as análises de especialistas internacionais como o cientista político americano Ian Bremmer, o professor de direito e ex-ministro português José Manuel Durão Barroso, o historiador britânico Niall Ferguson, entre outros.

Continua após a publicidade

Todos são unânimes ao afirmar que as configurações e organizações criadas após a Segunda Guerra Mundial não existirão mais — ao menos em seu formato atual.

Apesar das críticas que possamos ter à arquitetura do mundo que conhecemos, liderado pelos próprios Estados Unidos, é inegável o impacto positivo gerado para a humanidade em aspectos essenciais como paz, saúde, combate à fome e direitos humanos. Sem esse modelo, dificilmente teríamos alcançado tamanho desenvolvimento e cooperação.

Ocorre que, agora, o próprio arquiteto desse sistema parece ter se desgostado de sua obra e deseja refazê-la ou até mesmo destruí-la.

A recente decisão dos EUA de deixar a OMS, sob a alegação de ineficiência e influência política excessiva de outros países, especialmente da China, levanta questões cruciais sobre o futuro da governança da saúde global.

Continua após a publicidade

Do ponto de vista financeiro, a OMS perderá seu maior contribuinte, impactando diretamente programas essenciais como o combate a malária, tuberculose e HIV, além da vigilância epidemiológica e da resposta rápida a emergências sanitárias.

Em outros aspectos, corre-se o risco de termos uma organização menos influente e menos capaz de definir e coordenar políticas globais de saúde — o que é crítico diante de possíveis novas pandemias. É um cenário desfavorável para a ciência e para a vida humana — em todos os lugares do planeta.

+ LEIA TAMBÉM: Mortes por sarampo nos EUA reforçam importância da vacina

Causas e consequências

Mas por que os EUA desejam desconstruir esse modelo de organização, que, apesar das críticas, gerou tantos resultados positivos?

Infelizmente, na geopolítica, a moralidade é um tema secundário frente às estratégias políticas e econômicas dos países. A história nos mostra que a vida humana importa mais ou menos dependendo de onde essas pessoas nascem e em qual contexto econômico estão inseridas.

Continua após a publicidade

O mundo tornou-se demasiadamente multipolar, e a influência crescente de diferentes países nesses organismos resultou em um desvio da intenção original, que era manter a ingerência sobre eles. Como esse controle já não ocorre mais, a lógica americana parece clara: se não podem controlá-los, não há por que financiá-los.

Em termos práticos, essa mudança pode gerar uma OMS menos ágil e menos financiada para lidar com crises sanitárias globais. No entanto, essa desconstrução promovida pelos EUA — e seguida por nações como a Argentina — pode gerar, além de incerteza, um despertar na União Europeia, que se vê cada vez mais isolada nesse novo mundo multipolar, onde os países europeus perderam protagonismo e já não podem, nem devem, contar com a proteção americana, seja ela militar ou econômica.

Há, ainda, a possibilidade de que a saída dos EUA da OMS gere um efeito inesperado: a busca por uma estrutura de financiamento mais diversificada, reduzindo a dependência de um único país ou região.

A União Europeia tenderá a aumentar sua participação, enquanto novas parcerias com organizações filantrópicas e empresas privadas podem emergir. Isso poderia tornar a OMS menos vulnerável a disputas políticas e mudanças de governo nas grandes potências, garantindo maior autonomia técnica.

Continua após a publicidade

Para o mundo, a saída dos EUA da OMS simboliza mais um capítulo da fragmentação da governança global, em um momento em que os desafios sanitários exigem respostas integradas e rápidas.

No longo prazo, o sucesso ou o fracasso da OMS sem os EUA dependerão da capacidade de adaptação da organização e do compromisso de outros países em preencher essa lacuna. O que está em jogo não é apenas o financiamento de uma agência internacional, mas a eficácia da resposta a futuras pandemias e crises sanitárias.

Burocracia, ineficácia, desperdício e má gestão são críticas recorrentes a muitas dessas instituições mundiais, que devem, de fato, ser investigadas e aprimoradas a fim de garantir um melhor impacto na vida das pessoas ao redor do planeta.

Mas uma coisa é certa: a saúde global é interconectada, como nos mostrou a pandemia de covid-19. Goste-se ou não da verdade, o fato é que nenhum país, por mais poderoso que seja, conseguirá enfrentar sozinho os desafios sanitários do século 21.

Compartilhe essa matéria via:
Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Domine o fato. Confie na fonte.

10 grandes marcas em uma única assinatura digital

Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*
a partir de 9,90/mês*
ECONOMIZE ATÉ 63% OFF

Revista em Casa + Digital Completo

Você pediu, a gente ouviu. Receba a revista em casa a partir de 9,90.
a partir de R$ 9,90/mês

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$118,80, equivalente a R$ 9,90/mês.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.