Entre as diversas vacinas contra a Covid-19 já aprovadas no mundo, qual é a melhor? Para especialistas que participaram de um webinar sobre o tema promovido pela Fapesp, não é possível responder a essa pergunta no momento. Como os imunizantes foram desenvolvidos por técnicas diferentes e testados em condições distintas, os resultados dos ensaios clínicos de fase 3 já concluídos simplesmente não são comparáveis.
“Não dá para dizer que a proteção de uma determinada vacina é melhor que a de outra, porque elas não foram equiparadas entre si e os desfechos clínicos avaliados são diferentes”, disse Ricardo Sobhie Diaz, professor da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
Na avaliação da infectologista Mirian Dal Ben, do Hospital Sírio-Libanês (SP), as pessoas devem tomar “a primeira opção que tiverem a oportunidade”, pois todas estão sendo testadas com rigor e nenhuma será aprovada sem dados de segurança e eficácia que justifiquem a liberação em larga escala.
Esta também foi a posição defendida pelo professor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) Eduardo Massad. “Eu já tomei a CoronaVac. Mas tomaria qualquer uma. A primeira que aparecer, tomem”, afirmou o médico.
Durante o evento, Diaz explicou as diferentes plataformas existentes para a produção de vacinas. A mais antiga e estudada é a de vírus inativado, como é o caso da CoronaVac (desenvolvida pela chinesa Sinovac Biotech e testada no Brasil pelo Instituto Butantan) e da Covaxin (do laboratório indiano Bharat Biotech).
Esse tipo de imunizante já é usado no combate a doenças como gripe, cólera, raiva, poliomielite, hepatite A e peste bubônica. A técnica consiste em cultivar o patógeno em laboratório e inativá-lo com calor ou radiação para que, ao ser injetado no organismo humano, não cause doença, mas induza uma resposta de defesa.
Outras modalidades de vacina estão em desenvolvimento ou já estão sendo utilizadas contra a Covid-19. São elas:
- As de vetor viral (como a russa Sputnik V, do Instito Gamaleya, a britânica ChAdOx1, da Universidade de Oxford com o laboratório AstraZeneca, e a norte-americana Ad26.COV2.S, da Janssen/Johnson & Johnson). Nelas, uma proteína do Sars-CoV-2 é inserida em um tipo de vírus incapaz de se replicar no organismo humano
- As genéticas (como a dos laboratórios Moderna, Pfizer/Biontech e Fosun Pharma), que consistem em injetar ácidos nucleicos do novo coronavírus para induzir no corpo humano a produção de proteínas virais
- As vacinas proteicas subunitárias (como a do laboratório norte-americano Novavax), feitas com fragmentos do vírus.
Em sua apresentação, Dal Ben explicou como são desenhados os estudos clínicos dedicados a avaliar a segurança e a eficácia dos imunizantes. Até a fase 2, a atenção dos pesquisadores está voltada para os chamados “desfechos laboratoriais”. Ou seja, normalmente se investiga em que medida os vacinados desenvolvem imunidade humoral (anticorpos capazes de neutralizar o vírus) e celular (linfócitos que reconhecem e destroem células infectadas pelo Sars-CoV-2).
Essas questões também são mensuradas na fase 3. Contudo, nesse caso, a principal meta é avaliar os “desfechos clínicos” associados à imunização. Segundo a médica, uma pesquisa clínica de fase 3 pode tentar responder a diferentes questões. Por exemplo: quanto uma dose protege contra a ocorrência de Covid-19 ou qual é a proteção conferida por duas doses do imunizante? Também se pode avaliar em que medida o produto evita hospitalizações, mortes ou a transmissão assintomática do vírus pelos voluntários.
É com base nas questões a serem respondidas que se define o desenho do estudo: quantas pessoas serão incluídas, qual deve ser o perfil da população estudada e como os voluntários serão divididos. E há vários outros pormenores.
De acordo com Dal Ben, os estudos de fase 3 realizados para medir a eficácia das vacinas contra a Covid-19 adotaram critérios muito variados, o que impossibilita a comparação dos dados. No caso da CoronaVac, por exemplo, os casos considerados como suspeitos deveriam apresentar febre, tosse, falta de ar, fadiga, dor muscular, cefaleia, dor de garganta, congestão nasal, náusea, vômito ou diarreia. Já na vacina da AstraZeneca, só foram considerados como suspeitos os pacientes que manifestaram febre, tosse, falta de ar, anosmia (perda do olfato) ou ageusia (perda do paladar).
Outro ponto que dificulta a comparação, segundo Massad, é o fato de os participantes de cada estudo terem sido vacinados em momentos e locais diferentes. Isso faz com que o grau de exposição ao vírus não seja equiparável.
*Este conteúdo é da Agência Fapesp.